domingo, 5 de setembro de 2010

QUANDO O CENSO BATER NA MINHA PORTA



Sou mameluco, sou cafuzo?
Negro de keto ou nagô?
Amarelo, pardo, índio,
minha cor qual é que é?
Judeu, ateu, ET
Cristo, buda, oxumaré
Qual é a minha tribo
responde, IBGE! ..."
– De um samba-enredo dos jornalistas João Pimentel, Marceu Vieira e Arnaldo Bloch, em O Globo, 29.08.2010


Quando o Censo chegar aqui no Lote
Pra saber minha cor ou minha origem,
(Pois é cláusula que hoje o senso exige
Pro Brasil entender qual é seu dote),
Eu que sei que sou afro realmente,
Por meus beiços, nariz e pixaim
Que me dizem na certa de onde vim,
Pela história de vida dos parentes
De racismo e exclusão sempre presentes;
Pela saga de meus antepassados
Imigrantes também, só que forçados,
Eu respondo: sou afrodescendente!

Todo negro nagô veio de Queto
Da fronteira Nigéria-Daomé
De onde veio a família do Pelé
E de muito sambista pardo e preto.
Veio negro do sul do continente
Certamente parente de Mandela,
De Cabinda, Luanda e de Benguela
Do sudeste africano e do oriente.
E eu que guardo esse mapa em minha mente
Quando o Censo bater na minha casa
Faço um passo de samba e mando brasa:
– Meu “cumpádi”, eu sou afrodescendente!

O Brasil é de fato misturado
Porém só se mistura nos porões:
Quando a coisa é nos altos escalões,
A alegada mistura nunca chega.
E isso assim de “meu nego” e “minha nega”
Só se passa na cama, e não na mesa.
Quando é pra compartilhar riqueza
Dividir posição proeminente,
Ninguém vai me querer como parente.
É por isso que, quando da entrevista,
Digo ao IBGE que sou sambista
E me orgulho em ser afrodescendente.

(NL, 30.08.10).

por Nei Lopes 16:53 Comments (2)

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